Criança que não dorme bem pode ter insônia comportamental

Tempo insuficiente de sono pode deixar a criança cansada e irritada.

A insônia comportamental é a forma mais comum de insônia na infância e ocorre em 10% a 30% das crianças pré-escolares. Consiste na dificuldade em adormecer e/ou manter o sono associado com determinadas atitudes da criança ou dos pais.

Na Medicina do Sono, classificamos a insônia infantil comportamental em dois tipos: distúrbio de associação e transtorno de falta de limites, podendo se apresentar como uma associação destes dois tipos.  

Sabemos que existem certas condições associadas com o início do sono que são necessárias para a criança adormecer e voltar a dormir após despertar durante a noite. Associações positivas são condições que a criança pode prover para si mesma (como bichinho de pelúcia, fralda de pano, naninha, chupeta), enquanto as associações negativas necessitam da assistência de outra pessoa (mamadeira, embalar).

Essas associações negativas também incluem estímulos externos (TV, carrinho, cadeirinha de carro) ou situações diferentes (cama dos pais, andar de carro). Geralmente, quando a condição associada ao sono está presente, a criança adormece rapidamente. Se não está presente, a criança apresenta despertares noturnos longos e frequentes.

O distúrbio de associação acomete principalmente crianças entre 6 meses a 3 anos. Antes disso, não podemos definir um diagnóstico de insônia comportamental, pois a capacidade de dormir ininterruptamente toda a noite é uma aptidão que o bebê desenvolve entre o 3° e o 6° mês de vida.

Transtorno da falta de limites

O transtorno da falta de limites refere-se à recusa ou demora para ir para a cama no horário estabelecido. Quando os limites são determinados, as crianças tendem a adormecer com mais facilidade. A recusa caracteriza-se por não ficar pronto para dormir, não ir para a cama, ou não ficar na cama.

Por outro lado, prorrogar o horário de dormir pode incluir diversos pedidos (sede, banheiro, mais um beijo de boa-noite) ou atividades adicionais (ver TV, ler mais uma história). Uma vez que a criança adormece, a qualidade do sono é normal e eles tendem a ter poucos despertares. No entanto, crianças com o distúrbio da falta de limites costumam ter um tempo de sono mais curto (30 a 60 minutos).

No caso da falta de limites, existem dois padrões de comportamento problemáticos. Há pais que colocam pouco ou nenhum limite no comportamento dos seus filhos. Por exemplo, podem deixar que a criança determine o horário de dormir ou permitem que durmam assistindo TV no quarto dos pais, prolongando o tempo para início do sono.

Ao mesmo tempo, existem pais que estabelecem limites imprevisíveis e irregulares, enviando mensagens confusas para a criança. Isso resulta na manutenção ou aumento dos comportamentos indesejáveis.

Causas clínicas 

É importante saber que a insônia infantil também pode estar associada a causas clínicas que interferem no sono da criança, reduzindo ou interrompendo o sono normal, como é o caso da cólica do bebê e das otites de repetição (dor de ouvido), altamente prevalentes. O refluxo gastroesofágico também deve ser sempre considerado no diagnóstico, assim como o uso de medicações estimulantes, obstrução de vias aéreas, crises de asma noturna, alergia ao leite de vaca, doenças neurológicas e psiquiátricas. Nesse caso, o tratamento da doença de base e o controle dos sintomas são fundamentais.

Consequências

Qualquer que seja a causa da insônia na criança, o resultado será sempre o mesmo: haverá um impacto negativo no comportamento e nas suas funções, assim como também em seus cuidadores. Geralmente, uma criança com tempo insuficiente de sono apresenta cansaço e irritabilidade, podendo influenciar também na alimentação.

Vale lembrar que os problemas de sono da criança também atuam negativamente nos pais e cuidadores pois levam à privação de sono em adultos. Essa privação pode estar associada à falta de concentração no trabalho, acidentes no trânsito, sentimentos negativos e de frustração em relação à criança e até depressão.

Tratamento

O tratamento da insônia comportamental requer uma avaliação detalhada das causas e dos fatores predisponentes, sendo que as estratégias mais utilizadas são higiene de sono e terapia comportamental.

A terapia comportamental apresenta resultados duradouros e na maioria das vezes efetivos, produzindo mudanças tanto na resistência de iniciar o sono, como nos despertares noturnos. Baseia-se em rotina, horário regular de dormir e adormecer de forma independente. Em alguns casos pode ser necessário um acompanhamento psicológico da criança e da família.

Higiene do sono para toda a família

• Manter horário de sono regular e apropriado
• Evitar cafeína (chá, café, refrigerante)
• Evitar atividades físicas após o anoitecer
• Manter ambiente calmo e pouco iluminado para conduzir ao sono
• Evitar o uso de equipamentos eletrônicos (televisão, rádio, computador, tablet, celular)
• Estabelecer uma rotina da hora de ir para cama


Referência:

– AlVES, RC, In: Capítulo Meu filho não dorme – Insônia Comportamental – SPSP, 2017
– AlVES, RC, In: Distúrbios do Sono, Livro Desenvolvimento da Criança, 2017.
– AlVES, RC, In: Capítulo Sono e seus Transtornos: Do Diagnóstico ao Tratamento (Dr. Luciano Ribeiro)

Veja o vídeo explicativo sobre higiene do sono:

Assista também ao bate-papo com a Dra. Vanessa Radonsky, endocrinologista pediátrica, sobre distúrbios do sono na infância: