Sono e Obesidade: o que é importante saber

Por Dra. Erika Cristine Treptow *

Nas últimas décadas foi observado mundialmente um aumento expressivo da obesidade. Dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2019 evidenciaram uma prevalência de obesidade em 26,8% da população adulta brasileira. Houve também um crescimento da doença nas crianças e adolescentes e as evidências apontam que 6,7% dos adolescentes do Brasil são obesos.

A obesidade representa um risco para a qualidade de vida, por estar associada com o desenvolvimento de doenças metabólicas e cardiovasculares como a diabetes tipo 2, hipertensão arterial sistêmica, infarto agudo do miocárdio, entre outras. Além disso, menor produtividade e distúrbios do humor como ansiedade e depressão são observados em pessoas obesas. Estudos mostram que uma associação muito frequente é a presença de obesidade e distúrbios do sono.

Indivíduos com obesidade dormem pior. Um interessante estudo italiano mostrou que as queixas de roncos, engasgos durante o sono, sono não reparador e sonolência excessiva diurna eram mais frequentes em participantes obesos do que nos participantes com peso dentro da normalidade. É importante ressaltar que neste estudo foram excluídas pessoas com diagnóstico de distúrbios respiratórios do sono.

Uma das maiores associações entre obesidade e sono é a apneia obstrutiva do sono. Esta doença, caracterizada por recorrentes obstruções parciais e totais da passagem de ar pela via aérea superior durante o sono, tem a obesidade como um dos maiores fatores de risco para o seu desenvolvimento. O acúmulo de gordura ao redor da via aérea superior e na região abdominal, além de mudanças nos hormônios que causam fome e saciedade resultam num risco 10 vezes maior de desenvolver apneia obstrutiva do sono nos obesos em comparação com pessoas com peso normal.

Hábitos de vida pouco saudáveis reforçam a associação entre sono e obesidade. Quando dormimos menos do que seria esperado para a faixa etária ou quando o sono ocorre de maneira fragmentada e não restauradora, instala-se uma situação ideal para o ganho de peso. Dormir mal reduz nossa capacidade para realizar atividades físicas, provoca o aumento da grelina, a qual é um peptídeo promotor da fome. Não apenas sentimos mais fome como a necessidade maior é de ingerir alimentos ricos em gordura e doces. Já a leptina, hormônio relacionado com a saciedade encontra-se diminuída quando o sono é insuficiente. Outro fator importante é que quando permanecemos mais tempo acordados, aumenta nosso tempo com oportunidade para ingerir mais alimentos.

Desta maneira, é possível concluir que tanto a obesidade pode ocasionar maiores distúrbios do sono quanto os distúrbios do sono podem levar ao desenvolvimento da obesidade. A boa notícia é que a obesidade é um fator modificável. Uma dieta balanceada, a prática de exercícios físicos, medicações específicas e a cirurgia bariátrica fazem parte dos tratamentos disponíveis.

O tratamento da obesidade sempre deve fazer parte do plano terapêutico dos pacientes com distúrbios do sono. Particularmente, na apneia obstrutiva do sono, um estudo que acompanhou pacientes por quatro anos demonstrou que uma redução de 10% do peso corporal estava associada com uma redução de 26% do índice de apneia e hipopneia (IAH), medida utilizada para quantificarmos a gravidade da doença. Um estudo mais recente demonstrou que reduções de 2,5% do peso corporal já resultam em diminuições significativas do IAH.

Mudanças de hábito de vida são fundamentais para um bom equilíbrio entre sono e peso. O tipo de alimentação que ingerimos durante a noite e o horário das nossas refeições podem influenciar nosso padrão de sono. Recomenda-se ter uma alimentação mais leve no período noturno e cessar a alimentação algumas horas antes de dormir.

Se você se interessou por este assunto e gostaria de aprender mais, recomendo as seguintes referências:

1. Low sleep quality and daytime sleepiness in obese patients without obstructive sleep apnoea syndrome. J Intern Med. 2003 May;253(5):536-43.
2. Obesity and sleep disturbance: the chicken or the egg? Crit Rev Food Sci Nutr. 2019;59(13):2158-2165.
3. Eating Late Negatively Affects Sleep Pattern and Apnea Severity in Individuals With Sleep Apnea. J Clin Sleep Med. 2019 Mar 15;15(3):383-392.
4. Obesity: global epidemiology and pathogenesis. Nat Rev Endocrinol. 2019 May;15(5):288-298.
5. The epidemiology of sleep and obesity. Sleep Health. 2017 Oct;3(5):383-388.
6. Impact of Weight Loss Management in OSA. Chest. 2017 Jul;152(1):194-203.
7. Meal timing influences daily caloric intake in healthy adults. Nutr Res. 2014 Nov;34(11):930-5.
8. A fatty meal aggravates apnea and increases sleep in patients with obstructive sleep apnea. Sleep Breath. 2014 Mar;18(1):53-8.

 

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*Dra. Erika Cristine Treptow é pneumologista com área de atuação em Medicina do Sono, médica e pesquisadora do Instituto do Sono.
Artigo enviado gentilmente pela especialista ao site Sono e Medicina.